Coaching generativo

O Coaching em geral e os níveis neurológicos

Robert Dilts tem vindo a desenvolver uma abrangente metodologia de coaching com PNL sistematizando o tipo de intervenções e técnicas para cada situação particular baseando-se no famoso modelo dos “níveis neurológicos” de comunicação, mudança e aprendizagem.

Cada pessoa ou organização encontra-se num processo em que cada um destes níveis pode necessitar de atenção especial. O coach joga diversos papéis e aplica diferentes ferramentas consoante o nível de consciência, objetivos, processo pessoal e necessidades do coachee:

* Para questões referentes ao “mundo exterior” temos necessidade de um “guia” que conheça o terreno. Cria condições, conhece o caminho mais apropriado, oferece segurança e apoio.

* O “coach” no seu sentido tradicional e que tem a sua origem no desporto, ajuda o coachee no “âmbito comportamental” a atingir o máximo das suas possibilidades. Contribui para uma melhoria dentro de um contexto particular.

* O “professor” ou “instrutor” é, por excelência, aquele que ajuda no crescimento das capacidades cognitivas e alargamento das “competências”. Apoia no desenvolvimento de novas estratégias de pensar e agir.

* Quando se fala da descoberta das possibilidades inconscientes, influenciar e libertar a sabedoria interior, desenvolver e ativar “crenças e valores” de forma positiva, então o coach é chamado a jogar o papel de “mentor”.

* Quando entram em jogo aspetos ao nível da “identidade” precisamos de um “sponsor”. Envia mensagens de reconhecimento, menciona e apoia incondicionalmente a essência individual para ajudar a atingir os prodigiosos e infinitos recursos latentes em cada ser humano ou num grupo.

* Ao nível da “espiritualidade”, quando o apoio ao outro, dentro ou fora da organização, ultrapassa os níveis de guia, coach, professor e sponsor precisamos um “Coach com C maiúsculo”, um “awakener” que leve as pessoas e as empresas a realizarem uma conexão relacional com a sua missão no mundo, contribuição para a sociedade e para com o planeta.

A forma encontrada por Robert Dilts e Steffen Gilligan para o desenvolvimento de um Coaching com C maiúsculo foi o “Coaching Generativo”.

 

O que é o Coaching Generativo?

O conceito de “generatividade” refere-se à descoberta, atualização e enriquecimento de recursos de tal forma que contribuam para a criação de um resultado inovativo, algo que nunca existiu. Pretendem-se mudanças ao nível da identidade e da experiência que as pessoas têm em relação aos sistemas maiores no quadro de uma contribuição para a construção de um mundo melhor.

Com o Coaching Generativo pretende-se ativar as infinitas possibilidades do inconsciente criativo de modo a deixar emergir algo que nunca antes teve lugar. É resultado do trabalho conjunto em que uma PNL sistémica de Robert Dilts se encontra com o desenvolvimento de um novo conceito de transe que teve o seu fundamento em Milton Erickson e que é fruto do trabalho do psicoterapeuta Stephen Gilligan.

O coach ajuda o cliente no estabelecimento de uma conversa, muitas vezes metafórica, entre o seu inconsciente criativo e o seu mundo consciente.

 

A física quântica e o inconsciente criativo

Hoje há uma forte tendência em unir os conceitos quânticos às teorias sobre a consciência. Assim também Dilts e Gilligan fazem uso da quântica como metáfora para ilustrar algumas das características do Coaching Generativo, por exemplo, o conceito superposição como uma das propriedades mais interessantes do campo quântico. Gilligan define esta superposição como sendo o campo ondulatório que contém simultaneamente todos os estados possíveis de uma coisa e aplica tal princípio ao mundo psicológico para definir o inconsciente criativo. O inconsciente criativo engloba todos os estados possíveis em termos de identidade: o futuro, o passado, campos relacionais, sistemas familiares, arquétipos… todas as possíveis expressões de nós mesmos, o que fomos e no que nos poderemos tornar.

Este mundo interior de possibilidades infinitas é condicionado pela nossa interação connosco e com os outros: ao observarmo-nos e ao observar os outros tendemos a congelarmo-nos ou colapsarmo-nos num estado particular em detrimento de todos os outros estados possíveis passando a ser escravos de um único modelo do mundo preservado por todo um sistema limitado por crenças e valores.

 

O Estado Desejado são intenções

A questão toda é conectarmo-nos a esse campo criativo de recursos para “generar” possibilidades “fora da caixa”. Para tal há que sair da linguagem lógica formal e usar uma linguagem metafórica.

Não se trabalha aqui de objetivos e metas concretas bem especificadas. Pretende-se abrir espaço ao que nunca existiu, criar opções, aumentar possibilidades de escolha. Em vez de objetivos e metas detalhadas, trabalhamos com intenções. A pergunta básica para ser respondida em 5 palavras ou, se possível, ainda menos, é esta: – O que é que deseja criar de melhor na sua vida, o que tenha o máximo de importância para si?

A intenção pode ser formulada simbolicamente e terá de ser intuitivamente acompanhada por imagens emergentes de alto valor significativo assim como traduzida somaticamente na forma de postura ou movimento.

 

O estado de presença

Exercer Coaching Generativo exige que o coach seja ele mesmo o que está a facilitar e ajudar a despertar no coachee – é essa a diferença que faz a diferença. O coach encontra-se num estado de presença, sem esse estado nada pode acontecer de mágico na relação.

Presença tem a ver com a capacidade de estar presente no aqui e agora, completamente centrado, ao mesmo tempo, nele mesmo e no coachee, neurónios espelho alerta, e conectado ao campo subjetivo que os contém.

Algumas das características constituintes de um estado de presença são: flow, plenitude de vida, criatividade, satisfação, empatia, calma confiante, conexão…

 

O Ego e a Alma

Para entender melhor este conceito de “conexão” talvez seja o momento de introduzir dois termos comuns muito utilizados por Dilts em PNL de 3ª geração: o Ego e a Alma.

Considera-se o “Ego” como sendo fabricado com base em “filtros cognitivos” (crenças, modelos mentais, regras, interpretações, linguagem…); “filtros somáticos” (estado do corpo, movimentos, postura, emoções, instinto, energia…); “filtros de campo” (resultado das gerações, da família, da profissão, do domínio social…).

Com base em omissões, generalizações e distorções, fabricamos o nosso modelo do mundo ao qual temos tendência a apegarmo-nos e tomá-lo como única realidade.

Estas limitações levam o “ego” a perceber-se a si e ao mundo a partir da sua perspetiva limitada e a estar ocupado com a sua própria preservação. Desconectado, o Ego foca-se nos perigos, constrangimentos, e persegue o prazer imediato ou a fuga desesperada à dor. Associam-se geralmente ao “ego” capacidades de ordem cognitiva tais como análise e estratégia. O seu fim é a segurança pessoal, salvaguarda, aprovação e reconhecimento, luta, controlo e benefício próprio. Pode tomar formas de auto arrogância e narcisismo ou de auto depreciação, autojulgamento e depressão.

As suas formas de ação consistem em inúmeras variações de luta, fuga, paralisação, estupefação, resignação…

O conceito subjetivo e metafórico “Alma” é definido aqui como uma estrutura energética profunda que fundamenta a identidade e não é propriamente influenciada pela família, cultura ou sociedade. Expressa-se na forma de uma contribuição ao sistema mais abrangente ao qual se conecta.

Palavras chave para caracterizar o Ego e a Alma são exatamente a conexão (Alma) e o isolamento (Ego).

Enquanto o Ego se caracteriza como compartimento estanque, a Alma está conectada a uma estrutura profunda maior, um espaço mais abrangente pleno de significado.

O Ego gira à volta do que é permitido dentro dos quadros das suas próprias crenças, direcionado a Ter e Fazer. A Alma foca-se em motivações internas tais como Ser, Despertar, Serviço, Contribuição, Conexão, e anuncia e realiza a sua Missão e contribuição ao mundo orientada para uma Visão sobre o que podemos criar para enriquecer o planeta. O Ego concentra-se no seu Papel social girando à volta da sua própria Ambição.

 

3 formas de viver a vida

Poderíamos dizer, citando Joseph Campbell (1904-1987), o célebre autor de “O Herói de Mil Faces”, que a vida pode ser vivida de três formas distintas:

* A primeira corresponde ao ideal do ego, a vida convencional considerada “normal” em que somos chamados a viver a vida dos outros e copiar os valores da sociedade tradicional, do sucesso na escola, diplomas, carreira, dinheiro, estatuto, uma vida sobretudo caracterizada pela reprodução da rotina. É a vida de “aldeola”.

* Muitos não se adaptam a este tipo de vida e rejeitam-na como superficial ou são rejeitados por ela, seja devido à cor da pele, orientação sexual, religião, baixo valor socioeconómico, até por ser mulher. É uma alternativa aos ideais do ego e da sociedade tradicional em que muitas vezes o cinismo, a apatia e a agressividade se manifestam na droga, na criminalidade, no fundamentalismo, no ódio ou no desespero.

* O “Coaching Generativo” é uma contribuição para a construção de uma terceira via. Tem início com aquilo que Joseph Campbell denomina o “apelo”, uma espécie de despertar do piloto automático causado pelo transe negativo inconsciente em que vivemos, transe este causado por problemas de saúde, relações frustradas, ansiedade, sensações de vazio e depressão, falta de significado. Neste caminho respondemos a uma chamada subjetiva apelando-nos à realização do nosso propósito de vida e não do propósito dos outros.

 

Estados de Coach e Crash

A vida de aldeola e o exílio com as suas características desumanas, aumentam extraordinariamente as possibilidades da manifestação do que chamamos estado CRASH.

As principais características de tal estado são:

C ontraction (Contração neuromuscular e aparecimento de sintomas psicossomáticos como resultado de um estado de alerta perante os perigos e ameaças do mundo que acabarão

por se traduzir em luta, fuga, paralisação ou resignação),

R eaction (Reatividade repetitiva característica do funcionamento em piloto automático),

A nalysis (Análise cognitiva característica de uma cabeça sem ligação ao corpo),

S eparation (Sentido de separação caracterizada por lutas entre conflitos internos),

H urt (Dor, ferida, sofrimento, ofensa, vazio, falta de significado no que se faz…).

 

O oposto é o estado COACH. As características atribuídas a um estado de COACH são:

C entered (É um estado centrado, ligado ao nosso corpo, às nossas raízes e à nossa inteligência somática, ao chamado “cérebro entérico”, à barriga e à terra),

O pen (Significa abertura ao outro e ao mundo, sentindo o “cérebro cardíaco” situado no coração. Tanto o cérebro cardíaco como o entérico têm merecido nos últimos anos especial atenção por parte das neurociências),

A ttending with Awareness (Estado de alerta, consciente, desperto e liberto de apegos a crenças e valores, livre de preconceitos e julgamentos redutores),

C onnected (Conectado às nossas três inteligências, a “cognitiva”, a “somática” e a “relacional”. Esta última refere-se à inteligência que nos liga ao todo maior e que é designada como “campo”),

H olding (Refere-se à hospitalidade, uma espécie de trabalho mágico que consiste em acolher e abraçar e transformar de forma humana, criativa e inovativa, tudo o que possa surgir dentro e fora de nós).

 

O estado COACH não só nos liga aos nossos recursos mais profundos como gera automática e naturalmente a empatia que o mundo necessita para que possa sobreviver. Dá-nos o sentido de responsabilidade e apela-nos à construção de uma sociedade mais humana, uma sociedade a que as gerações futuras se orgulhem de pertencer. 

 

O estado generativo

Qualquer caminho na direção da realização da intenção significativa ou transformação pessoal ou passagem através de dificuldades internas e externas inevitáveis durante o próprio processo da “viagem do herói” que segue o seu “apelo”, exige um estado sensorial adequado correspondente “à melhor versão de nós mesmos”, plenos de recursos. O Coaching Generativo concentra-se na ativação e intensificação máxima de recursos.

Em momentos desprovidos de bloqueio neuromuscular há uma aceleração de energia, uma força vital que se traduz em ação criativa e inovadora resultado de termos o “canal aberto”, uma expressão atribuída a Martha Graham, a fundadora da dança moderna. Em tal estado o processo criativo é experimentado como não fluindo do eu, mas através de nós, tal como nos expressam grandes génios da nossa história como Leonardo da Vinci, Einstein, Mozart e até Michael Jackson quando falam das suas criações como não surgindo deles, mas emergindo através deles independentemente dos desígnios da vontade.

 

O processamento da mudança

O processo geral para operação da mudança ocorre em 6 passos. Começa pelo relaxamento e pela criação de um campo caracterizado por centragem, coração aberto, estado de atenção consciente, conexão tanto interna como ao campo maior e mais abrangente como a comunidade ou o universo e, finalmente, disponibilidade absoluta para acolher tudo o que possa emergir durante o processo.

Seguidamente, no aqui e agora na linha do tempo, é expressa a intenção para a sessão num máximo de cinco palavras, acompanhada pela representação simbólica e pela manifestação somática. Esta intenção enquadra-se na visão, missão, ambição e papel do coachee no mundo: que espécie de mundo deseja ver construído para as gerações futuras, qual a sua contribuição única, que tipo de vida quer criar para si e que papel vai desempenhar para que o seu dom único possa ser manifesto?

O terceiro passo refere-se à atualização do estado generativo feito de recursos de situações passadas, pessoas que serviram para nós como guias, antepassados, símbolos, figuras lendárias, energias arquétipas (por exemplo: força, afeto e humor).

Finalmente, quarto e quinto passo, passa-se à ação e transformação das dificuldades em recursos. Geralmente vão surgir bloqueios feitos muitas vezes de crenças limitadoras, partes de nós em conflito, medos. Não se trata de lutar contra eles, mas de serem abraçados, ouvidos, integrados num nível de consciência superior ocorrendo naturalmente uma mágica transmutação em que as “sombras” se tornam muitas vezes nas forças mais relevantes de apoio.

Qualquer passo dado ou qualquer palavra pronunciada, tudo é feito em silêncio mental, quietude somática e criando espaço no campo. A atenção primária reside na ressonância no corpo.

As respostas encontradas são na maioria das vezes de natureza simbólica.

O sexto e último passo é reservado à orientação e instalação do futuro e à prática para aprofundamento da mudança generativa. São declarados compromissos, volta-se trazendo ao mundo a nossa dádiva única, o dom único que cada um trás consigo e que tende a perder-se no meio da cacofonia da sociedade global. 

 

Para quem é adequado o Coaching Generativo?

O Coaching Generativo não anula qualquer outra forma de intervenção em coaching. E certamente que pode ser utilizado também para estabelecimento de metas concretas no futuro, para relacionamentos pessoais, familiares ou profissionais, para lidar com padrões negativos, crenças limitadoras, etc.

Mas o Coaching Generativo é altamente indicado quando há necessidade de rutura com formas antigas de funcionar, quando romper com estruturas rígidas se torna crucial, quando em tempos de crise, crescimento e transformação pessoal profunda, sair definitivamente da caixa se torna pertinente.

 

 

José Figueira